Da BBC
Reza a lenda que o conflito foi deflagrado por um peixe: em vez de morrer em batalha ou de causas naturais, Henrique 1º foi vítima de seu apreço por lampreias.
Tal história tem origem duvidosa, diz o historiador Giles Gasper, da Universidade de Durham. Ainda assim, muitas crianças britânicas ao longo dos séculos aprenderam o peixe que teria matado um rei.
Mas as lampreias continuaram sendo parte do banquete real por muitas eras.
Os cientistas também adoram esses peixes. Só que por outras razões.
Ecologistas sabem que as lampreias são responsáveis pela manutenção da saúde dos rios. Médicos estudam-nas para entender sua capacidade incrível de regeneração mesmo depois de danos severos - um fator de cura que pode oferecer uma forma de regenerar lesões na coluna de humanos.
Origens humanas
Lampreias se parecem com enguias. Têm um corpo longo e flexível, com olhos, boca e guelras de um lado, e uma barbatana do outro.
Mas é o que as lampreias não têm que as torna especiais.
Mais notavelmente, as lampreias não têm mandíbulas. Suas bocas são uma espécie anel permanentemente aberto, repleto de dentes afiados - que as lampreias usam para morder outros peixes e sugar seu sangue.
Ancestrais
A falta de mandíbulas pode ser peculiar hoje, mas há centenas de milhões de anos era norma no mundo animal. As lampreias e o peixe-bruxa são as únicas espécies que ainda sobrevivem. Segundo paleontologistas, fósseis datando de mais de 360 milhões de anos atrás sugerem que pouco mudou nelas.
Isso não quer dizer que nossos ancestrais eram lampreias. É mais ou menos como os chimpanzés. Os dois animais explicam bastante sobre nossos ancestrais, mas nenhum deles está diretamente na linha evolucionária direta humana.
Mas voltando à esfera gourmet: por que as lampreias eram tão apreciadas na antiguidade, ao ponto de estimular a gula de Henrique 1º? Uma das teses, segundo o professor Hume, é o fato de o peixe ser calórico e carnudo.
Essas características específicas eram bastante úteis em uma era em que a força da religião frequentemente impunha jejuns que restringiam o consumo de carnes que não fossem de peixes. “Dias de jejum eram quase um terço do ano”, afirma Gasper.
Mesmo nos dias de hoje, a lampreia ainda tem ligações reais. A atual soberana britânica, Elizabeth 2ª, recebeu tortas de lampreia de presente por ocasião do 25º e 50º aniversários de reinado.
Regeneração
“Esses peixes são extremamente úteis para o ecossistema. Eles transportam nutrientes de lagos para rios e suas larvas filtram a água”, explica Hume.
Há ainda sua contribuição para a medicina: proteínas na saliva dos peixes agem como anticoagulantes e dilatam vasos sanguíneos, o que os ajuda a “vampirizar” outras criaturas marinhas.
Elas também têm alta tolerância a ferro, o que pode ser útil para pesquisadores estudando curas para a hemocromatose, uma condição que afeta pessoas incapazes de controlar a quantidade de ferro que absorvem de alimentos e que podem resultar em uma série de males, incluindo cirrose e disfunção erétil.
Por fim, há a incrível capacidade de regeneração destes peixes, que podem praticamente se recuperar totalmente de lesões totais em sua medula. Algo com que humanos podem atualmente podem apenas sonhar.
E um mapeamento genético de lampreias feito em 2013 revelou similaridades surpreendentes entre os genes delas e os nossos. “Muitas famílias de genes estão presentes tanto em lampreias como em humanos", diz Ona Bloom, do Instituto Feinstein de Pesquisas Médicas, nos EUA.
“E uma área com muitos genes em comum é o sistema nervoso”.
Sendo assim, pesquisas sobre a regeneração de lampreias podem proporcionar pistas de como promover o mesmo em outros animais. Ainda que tal tratamento ainda precise de muitos anos para ser desenvolvido, segundo Bloom."
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