Aves gigantes da Antártica estão contaminadas por agrotóxicos

O Brasil é atualmente o maior consumidor mundial de agrotóxicos. | Foto: iStock by Getty Images
Foi detectada a presença de diversas substâncias nocivas, entre as quais o DDT, banido nos EUA desde 1972.

Da Agência Fapesp -

Pesquisadores confirmaram a presença de contaminantes orgânicos no sangue de petréis-gigantes do sul de diversas colônias na Península Antártica. Estudos de carcaças e outros tecidos já tinham dado sinais da contaminação, agora confirmados a partir de amostras de sangue em que foi detectada a presença de diversas substâncias nocivas, entre as quais o DDT, pesticida banido nos Estados Unidos em 1972, quando se constatou que seu uso ameaçava a sobrevivência de diversas espécies de aves de rapina.

A pesquisa foi realizada pela bióloga Fernanda Imperatrice Colabuono, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP). Ela estudou os animais das colônias de petréis-gigantes das ilhas Elefante e Livingston, no arquipélago das Shetland do Sul, na Península Antártica.

O petrel-gigante-do-sul (Macronectes giganteus) é um animal magnífico e um importante predador de topo no Atlântico Sul e Oceano Austral. Com envergadura de asas de cerca de dois metros, é uma das maiores aves voadoras do planeta, menor apenas que o albatroz e o condor. São também longevos.

Petréis-gigantes podem viver mais de 50 anos. Passam a vida nos céus dos mares do Sul do planeta, à procura de comida.
 
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Nos verões antárticos de 2011/2012 e 2012/2013, a bióloga coletou amostras de sangue de 113 indivíduos e constatou a presença de contaminantes orgânicos como bifenilos policlorados (PCBs), hexaclorobenzeno (HCB), pentaclorobenzeno (PeCB), diclorodifeniltricloroetano (DDTs) e derivados, o pesticida clordano (banido nos Estados Unidos em 1988) e o formicida Mirex (banido nos Estados Unidos em 1978 e recentemente no Brasil).

Segundo Fernanda, todos esses poluentes orgânicos são persistentes no meio ambiente, têm ação cancerígena, causam disfunção hormonal e problemas reprodutivos. Os resultados foram publicados num artigo em Environmental Pollution.

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A pesquisadora afirma que, comparado aos níveis de contaminação nas aves do hemisfério norte, os níveis de contaminação detectados nas colônias de petreis na Península Antártica ainda são baixos. O objetivo agora é monitorá-los no longo prazo, para se “ter um indicativo da tendência de aumento ou decréscimo desses contaminantes ao longo dos anos no ambiente em que estas aves vivem”, diz a bióloga.

Cadeia de contaminação

O DDT é transportado pelo ar e pela chuva. Uma vez em rios e lagos, se acumula na cadeia alimentar. Os insetos contaminados são comidos por peixes e estes por outros predadores. Em cada patamar da cadeia alimentar o nível de acúmulo de DDT nos tecidos aumenta.

Seus efeitos nocivos se tornam mais visíveis quando se atinge o ápice da cadeia, nos predadores de topo. O petrel-gigante é um deles. Ele se alimenta de peixes, lulas e até de carcaças de outras aves. Ou seja, no trajeto de uma longa vida, ao comer centenas de quilos de peixes contaminados, a quantidade de contaminantes nos tecidos do petrel sempre aumenta.

Foto: iStock by Getty Images

Foi o que aconteceu nos Estados Unidos com os falcões-peregrinos e os condores da Califórnia. Nos anos 1960, suas populações começaram a declinar dramaticamente. Os condores chegaram a contar apenas umas poucas centenas de indivíduos. Estavam a um passo da completa extinção.

Foi quando se descobriu o papel do DDT naquela tragédia. Ao se acumular no corpo das fêmeas adultas, o DDT era repassado à casca de seus ovos, que se tornavam finas e frágeis, partindo com grande frequência. A reprodução da espécie estava ameaçada. Em 1972, a produção, comercialização e o uso do DDT foram banidos nos Estados Unidos. Com o tempo, as populações de falcões e condores começaram a se recuperar.

O Brasil é atualmente o maior consumidor mundial de agrotóxicos. O uso proibido do DDT foi proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apenas em 2009 – mas, como ele persiste no meio ambiente, sua presença ainda é detectada nos tecidos de animais como o petrel. A preocupação de Colabuono em acompanhar a vida de seus petréis-gigantes tem fundamento.
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